Maradona e o tango torto do menino rei. Por que os deuses nascem em villa Fiorito

Outubro é o mês do futebol.
Além de seu maior nome, PELÉ, o mês guarda os aniversários de Garrincha, que já foi homenageado aqui, e agora esse nome que não poderia faltar, Diego Armando Maradona.
Maradona...
A primeira vez que prestei atenção pra valer em Maradona foi em janeiro de 1981 com meus lúdicos 10 anos, assistindo Mundialito de Seleções vencedoras de Copas, disputado no Uruguai, em um sábado que aconteceria o clássico maior do Futebol Mundial, Brasil x Argentina. E amigo leitor, nada no futebol chega perto da grandeza de um Brasil x Argentina.
Os vizinhos de Sul América que haviam sido campeões mundiais em 1978 levaram o que tinha de melhor para o Uruguai, e o Brasil não ficou pra trás. Nosso timaço tinha Carlos, Getúlio, Oscar, Luizinho e Junior, Cerezo, Sócrates, Tita, Paulo Izidoro, Seginho Chulapa e Zé Sérgio. Éramos uma máquina que havia passado por cima da Alemanha de Rumenighe, Breitner, Fischer e Aloffs, com um 4x1 de fazer vergonha na estátua de Richard Wagner. Então no jogo, um pequeno camisa 10 da Argentina fazia de tudo para atrapalhar...
Maradona arrebentava com o jogo.
Driblava, chutava, armava, marcava, provocava. Um meia de 21 anos que bailava pelo lendário estádio Centenário. Era disparado o melhor homem ali, dentre os outros, apenas mortais. No entanto, como era um clássico Brasil e Argentina, coisas aconteciam. O Brasil atacou a fraca zaga Argentina e conseguiu um empate com um gol de Serginho Chulapa. Em seguida, após um bate boca entre o centroavante deles, Luque, e Oscar, nosso zagueirão meteu a mão na cara do barbudo. Maradona ao lado, deu um chute em Oscar e dai o pau comeu lindamente! Foi um dia em que Serginho Chulapa e Paulo Izidoro, bateram em toda nação portenha! Depois, o tempo passou e vi muito de Diego...
Vi Maradona apanhando demais na copa da Espanha em 1982. Depois vi o Athletic de Bilbao descer a porrada nele quando Maradona vestia a camisa do Barcelona. Porradas que resultaram numa fratura de tíbia, tirando de circulação por mais de três meses. Na sua volta, o vi fazendo gols de todas as formas em campos da Espanha e com a camisa da seleção Argentina. No entanto, num domingo em Bilbao, Maradona cansou de apanhar e arrumou uma briga generalizada no Sam Mammés, o que fez com que o clima para ele na Catalunha ficasse insuportável. Então em 1984, Maradona ruma para Nápoles, onde se fez toda magia dessa coisa ímpar chamada futebol...
Nápoles é uma região pobre do sul da Itália. Em 1984, ninguém dentro da própria bota, olhava pra região. Imaginem o mundo?! Pois é. Em um esforço sobre-humano, o pequeno time do Sul, levou Maradona para disputar o Cálcio. Seria algo como, Ronaldinho Gaúcho chegando no Figuresense, ou no Avaí para disputar o Brasileirão. Na época todo mundo dizia, que era o fim para Diego. Mas Maradona é algo um pouco maior que um réles jogador de futebol, pobre mortal. Diego é um semideus.
No país da bota, Diego jogou demais. Era um homem com uma cidade nas costas contra todo o resto do País. O que eu vi Diego jogar de bola, nas manhãs de domingo, durante as transmissões da TV Bandeirantes, tenho plena convicção que jamais verei, seja com Ronaldinho, seja com Kaká ou Messi, seja com um novo Puskas imaginário renascendo.
Com Maradona, a cidade de Nápoles entrou para o mapa múndi. Ganhou escudeto, Copa Da UEFA, subiu de status no futebol mundial e na sociologia europeia. E o mundo que insistia em não ver isso, viu em 1986...
Naquela copa, Diego já havia arrebentado em jogos contra Itália, Uruguai, Coréia... Mas faltava a sagração que os Deuses tem. Veio o jogo contra a Inglaterra num momento desgraçado para a geopolítica mundial. Em um clima acirrado, marcado pelas chagas do conflito que os dois países tiveram devido ao conflito nas Malvinas em 1981, uma guerra onde milhares de jovens argentinos foram assassinados, jogo aconteceu. E toda essa animosidade foi a campo.
Logo no começo, Maradona passa a ser caçado pelos ingleses. Terri Fenwick, jogador cavalar do Queenspark Rangers, numa disputa de bola, soca com vontade a cara de Diego sem bola. Uma estupidez revoltante. E o que Diego fez? Revidou com dribles, ginga, inteligencia, beleza e arte. O que aconteceu no Estadio Azteca naquele 22 de junho de 1986 é uma ode ao futebol em todos os tempos. Até gol de mão, Diego fez com uma elegância e uma beleza ímpar. Punho cerrado, saída do enorme goleiro Shilton e pimba! Gol de Mão para Argentina! Mas foi aos 9 minutos do segundo tempo, que os Deuses do futebol decidiram abençoar os que lá estavam.
Numa arrancada no meio campo, Diego começa a Driblar, todo o time Inglês. Margareth Tatcher, Rainha Elizabeth, e toda a dinastia vitoriana, seria vencida pelos dribles esgrimistas de Maradona. Passou por 5 jogadores, mais o goleiro Shilton para empurrar a bola para o fundo das redes.
Eu estava em casa e lembro como se fosse hoje. Ao pegar a bola e driblar Gary Stevens e Peter Reid, eu fui me levantando da poltrona da sala de casa e comecei a gritar “Vai Diego, vai Diego...” Meu pai correu pra sala e ajudou. Então eramos um coro: “Vai Diego, Vai Diego... Passa por esse, vai... Vai Diego...” - Silencio; Após ele driblar Peter SHilton, fizemos aquele pausa, aquele silêncio que precede os épicos pra depois explodir como o mais azulado portenho no bairro da Boca:
GOOOOOOOOOOOOOOOOOOLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLL!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Eu comemorei aquele gol como se fosse de meu Verde do Parque Antártica. Diego entrou com bola e tudo e entrou pra história. E essa é a história que deve ser contada quando falamos desse homem.
Que se dane os problemas que Maradona veio a ter em sua vida pessoal. Com relação a isso, fiz o que deve fazer quem sabe reverenciar as Majestades, torci. E então ele deu a volta por cima e acabou. Lembro de Diego com as centenas de discussões que tenho com meu amigo Argentino, Diego Saravedra quando ele sempre me diz:
“Pouco importa para nós Argentinos, se Pelé é o maior jogador do mundo. Ele é, você acha que a gente não sabe? Só que Pelé não é o maior jogador da Argentina. O rei de vocês Chelo, não é nosso Diego...” - Pois é...
Um menino pobre, faminto, nascido numa favela em Villa Fiorito... Um homem de 1,62m de altura, que fez gols de cabeça, que derrubou gigantes com quase o dobro de seu tamanho, que fez o mundo olhar para uma cidade pequena como Nápoles... Que despertou paixões e ódios com a camisa do Boca Juniors, que vestia a camisa da Seleção Argentina, como se fosse o ultimo dia da sua vida. Diego é muito mais...
Maradona é a vitória do povo. É a chance que o pobre tem de se dar bem de vez em quando. Maradona é o triunfo do improvável. É o contrário que pode acontecer. Maradona é a lágrima que me lava a retina agora. Lágrima boa, emoção boa, porque na vida, aprendi que a única lágrima que dói é aquela que não escorre a face. E Maradona, sem a menor sombra de dúvida é responsável por uma boa parte das lágrimas alegres que o futebol me deu.
Com tudo isso, o CANELA DE FERRO, hoje não falará de rodada, classificação nem nada, para homenagear humildemente aquele, que encheu os corações de toda uma nação de torcedores ávidos por algum encanto. E ele proporcionou vários. No seu aniversário de 51 anos, Maradona, tenho o maior prazer de te parabenizar e finalmente poder te dizer:
Obrigado Diego!
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